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Cronicando o Piauí: Antipatia

Meu irmão, vou abri mão de mim. Já não me aguento mais. Eita cara chato sou eu. Sou antipático. Canso qualquer beleza. Estou me deixando louco. O tico e o teco vivem a me perdoar e a me condenar. Vivo numa crise existencial intensa e itinerante. Vou me mandar para pqp. Vou me internar e vou me esquecer de mim. Vou dar um tempo. Estou me deixando louco. Pelo o amor de Deus!

Se estou em abstinência etílica, entro em parafuso. Em depressão e hiberno. Fico me indagando se vale à pena viver no ostracismo. Em penitência. À margem. Viver é participar! Começo as indagações. Dou-me ao exame de consciência e passo a perguntar o que é viver. Ora, viver é morrer! Simples assim.

Jogo tudo pro ar e caiu na cachaça. Orgia profunda. Sem medidas. “Quero é botar meu bloco na rua!” (Sérgio Sampaio). Gargalhadas com meus amigos nas mesas de bar. Desce uma. Desce duas. Desce mais. E, o importante, é que naquele momento não há problemas. E, se por acaso, aparecer algum, a mente corrupta rapidamente resolver. Não há problema ou dificuldade que a cabeça de um bêbado não resolva. Tudo é serpentina. É carnaval. O tempo passa com uma facilidade e num rapidez estonteante. Não há distância, nem obstáculo para um bebum. Tudo dar certo. E tá tudo certo. Sem perrengue. Vai o dinheiro das contas de água e de energia. A mensalidade da escola da meninada entra no fogo. O aluguei também. Logo a mente marginal, diz: “Amanhã falaremos com o agiota! Não se preocupe! A vida é agora!” E a orgia toma corpo. Chega mais um. Mais outro.

E a mesa vai se alongando em tamanho, piadas, gaitadas e conversas, umas por cima das outras. Ninguém se entende. Os assuntos são triviais, fartos e fatiados. Vem tira-gosto. Vem cerveja. Vem uísque. Vem Campari. Começam os fuxicos e as mentiras. Lá, pelas tantas, tá todo mundo rico. Sempre chega um para desviar a turma. Tipo assim: “Tá tendo pagode no Dirceu!” Aí, meu irmãozim, só Deus sabe onde iremos parar. Outro grita: “Tem forró no Parque Piauí, no ‘Club dos 100’!” Vamos lá! O pior é a Lei Seca, mas bêbado é bicho pra ter sorte. Já na madrugada, outro, cheio da manguaça, implora: “Vamos pro cabaré da Toinha! Lá, tem rapariga e vitrola pra botar música brega!” Já estamos lascado mesmo. Agora tudo é lucro. Aí a bagaceira em grande. Tem bêbado que chega a noivar. Faz declaração de amor. Sobe na mesa e canta à mulher amada. As raparigas já sabem que é só de migué. Loucura e safadeza de ébrio.

No dia seguinte, vêm as ressacas física e moral. É quando cai a ficha. Agora o bicho pega. Dor de cabeça e o juízo, no esconderijo do quarto, a indagar: “Eita, meu Deus, fiz muito papelão ontem!?” A vontade é de não sai do cafofo. Não meter a cara fora. Caramba!

Começam a chegar as notícias no Whatsapp. De quem a mulher mandou embora. Quem tocou fogo na roupa. Quem pegou a camisa suja de batom. É só dor de cabeça, meu irmão! “Nunca mais vou beber cachaça, juro!” Vai nada! É só chegar o final de semana. “Me lasquei!” Basta só uns quatro dias para se esquecer de tudo.

Com o tempo tudo vai voltando ao normal. Começo novamente as minhas pelejas comigo. Penso na morte. Aí volto a viver. Fazer novamente tudo “errado”, arrepender-se, pra depois fazer tudo de novo. Viver é uma batalha interminável e reciclável.

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