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Cronicando o Piauí: Conserto tudo

Vou montar uma oficina para consertar baladeira e concretar jeito de gente! Assim, encantando-as, vou também libertando corpos, bicos, mentes, pernas, asas e almas. Provocando estranhamento! Vou resgatar aves e pessoas baleadas, cansadas, feridas, estressadas, sofridas, desamparadas, mórbidas, desesperadas em vida, da via-sacra e do madeiro salvar. Transportá-las por sobre montes, montanhas, serras e mar, flores, matas, florestas e amar, terra, fogo, água e ar.

Vou ensiná-las colher risos, borboletas plantar, regar rios, em nuvens de algodão flutuar, surfar em bola de sabão, na primavera pintar, viajar feito avião, como eremita cantar, na chuva sonhar, como peixe voar, nadar feito pássaro, em flores bailar… para o mundo interior amalgamar, numa linda carta colorida que anuncia a alforria e no meio da praça Castro Alves, ao poeta, gritar.

Na nossa oficina, aos invés de chave de fenda, dor, prego, martelo, lágrimas, pé-de-ferro, tristeza, tachina, angústia, madeira, solidão, borracha, decepção, cola, escuridão… vai encontrar lápis de cor, sorriso, caramelo, balão, brigadeiro, paz, bombom, solução, chiclete, alegria, refrigerante, à exaustão, inocência, meladeira, língua de sogra, baião, céu, sol, lua e estrela de montão… Traga! Aquele brinquedo íntimo que está quebrado dentro do coração. O dia em que o mundo encheu de mágoa a solidão. Aquela noite em que roubou os sonhos e entregou à escuridão. Traga tudo! Inclusive, a dor de uma antiga paixão. O choro escondido no peito que nunca vingor na pulsação. O carnaval que sem confete, sem serpentina, Colombina no banheiro ficou na solidão.
Consertaremos de tudo!

Rosto enrugado nos raios de solstício, riso calado no beco do apito, euforia engessada nos corredores do ostracismo, pensamento coxo e desajeitado no andar do infinito, amor desejado de menino à sombra do tamarindo, flecha cravada ao peito depois de um beijo bendito, amizade despedaçada em cacos na rua do andarilho, sonho descosturado em cabeça santa de grilo, rosto enrugado em sulco de labirinto, pés enlatado em ponta de palito, corpo na cruz pregado lá pras bandas do sacrifício, olho estrábico na testa do Jacinto, ouvido desavisado na parede do descabido…

A casa de máquina fabricará uma nova infância para esquecer o adulto infame…

Assim, voltar a viver e a sonhar voar!

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