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Cronicando o Piauí: Embarque nessa

Meu barco é o carro nos trilhos de aço. O asfalto é o rio, o riacho. O bêbado caído na rua sem sapato. A vela é a flor na lapela do casaco. A saudade é o maestro das estrelas e o brilho da lua no pasto. O calor do beijo é quem carrega o flash dos abraços. A imensidão é o alicerce moleque e o barro barato. A coragem é quem planta espinhos e recolhe retalhos. Sou menino colorido, dorido, cinza torta em pedaços.

Meus pensamentos são em vidro vidraça, em cacos feito assoalho. Meus dias são o cetim carmim e o carnaval no solado alegre do palhaço. A mesma peneira menina que côa, depois recolhe em andrajos. O vento rola, pela estrada, folhas secas e revela presságios. Sou o fruto podre que aniquilou o diálogo do fraco. Os caminhos que nos levam são moinho, frasco quebrado, sumo do bagaço. A proa que rasga o lume, também, macula o peito e com cravo prega meus braços no madeiro esticado.

Às vezes, no escuro do quarto, sólido e solitário, surgem lembranças de mim no fundo falso do antigo retrato. Saber que não passo de um fiasco é um orgulho disciplinado. Os caninos felinos e as presas afiadas vão mitigando os passos no farto passado. Nunca quis soltar papagaio. Queria ser balão em liberdade rumo ao alto. As pegadas enigmáticas vivem orientando o futuro dos astros. O relógio da torre anda sempre atrasado. Sou Macunaíma prospectando o milagre do inanimado.

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