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Cronicando o Piauí: Particularidades

Nasço no bairro Cidade Nova, mas ainda não havia em mim consciência mundana. Mudamo-nos para o bairro Cristo Rei, no qual, resido atualmente.

Na minha infância andava com meus irmãos e nossos amigos por entre pássaros, baladeiras, aves, arapucas, árvores, forjos, campinho da pelada, papagaios, cedas, grudes, ceróis, linha Zero, talos de bambu, varas de pescar, canoa(que tomávamos emprestada sem o dono ter conhecimento) e banhos de rio até umas horas. Entrávamos nas quintas para “roubar” manga, caju, melancia, goiaba, milho… E pegar carreira do seu Viana, que todos anos fazia sua rocinha, para nós saquearmos. Assim, quando íamos banhar de rio, entrávamos na quinta do Zé Luíz para roubar cana e ele correr atrás de nós com uma espingarda bate-bucha velha e enferrujada para dar tiro de sal nas nossas costas. Como somos amigos do Zé Wilson, filho dele, depois de adultos ficamos sabendo que a mesma nunca foi carregada. Era só instrumento de encenação. Para quê o teatro ficasse verossímil. O intuito mesmo, era o susto da meninada, que saia em revoada por entre o canavial parecendo um bando de preás. E ele gritando:

“Pega, ladrão!!!”

Creio que, quando chegava a hora de dormir, ele, deitado em seu leito simplório e humilde, dava-se a sorrir dos sustos que nos pregava. Também, invadíamos a vazante do Pinheirinho para comer melancia sentados à beira do rio em dia de chuva rala. Era, realmente, uma vida bucólica. Silvícola. Silvestre. Os nossos fetiches eram a inocência a pureza e o frio na barriga no pular da cerca. Fazíamos as danações como um entretenimento lúdico. Éramos crianças e adolescentes bobos, tolos, ingênuos.

Tinha uma galera que sempre andava junta. Estudava na mesma escola. Alguns na mesma sala. Estava sempre junta e já se programando para as traquinagens do dia seguinte. Um dos mentores da “gangue dos clandestinos” era meu irmão primogênito: Walcácer.

Passou-se o tempo, como passa a sombra de uma árvore. Crescemos, o que jamais deveria ter havido, e nos debadamos feito aves de rapina. Casamos, tivéssemos filhos e filhas, nos separamos e nunca mais nos encontramos. Alguns sumiram, outros estão no Facebook, outros morreram… O tempo, matreiramente, se encarregou de tudo. Quando nos damos conta já se foi a manhã, do café da infância. Agora, vivemos a tarde, do almoço do adulto. Aí, ficamos esperando o anoitecer, do jantar da velhice e da morte.
Hoje, onde era natureza e infância, agora, é, concreto, escombros e obrigações. Onde era rua alegre de areia e picolé, encontra-se asfalto, acidente, calor e dor.

Sou estrangeiro em minha terra. Estou no ostracismo vivendo no mesmo lugar. Acho que eu é quem estou a margem do neopadrão. Olho e não me dou conta de mim. Está tudo tão cinza, opaco… literalmente, sem vida. Farmácias, panificadoras, igrejas, supermercados, postos de combustível, pizzarias, restaurantes, churrascarias, picanharias, semáforos, buzinas, depressão, estresse, ansiedade, bares, solidão, carros, motos, bicicletas, pedestres…

Ainda, escapo, meu Deus, agarrando-me e viajando no singelo e magnífico voo do amigo e saudoso urubu.

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