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Cronicando o Piauí: Fatos e feitos

Pensam ser eu um para-raios: não sou forte, sou fraco, sou plástico, sou vida e morte Severina com lampejos escassos de sertão.
Vivo feito uma ostra numa concha social. Vivo a literatura fantástica. Sou Macunaíma, Grande Otelo. No porão dos ratos. Respiro e transpiro num eremitério abstrato. Gosto mesmo é da maciota e da cambalhota. Correr por fora da raia. Na TV, rola a seleção. Mas eu não ligo e nem desligo.
A Peteca passa o tempo todo deitada debaixo da minha rede. Está senil. A Filó é serelepe. Não se comporta…

Eu tinha uma Monark, modelo Tigrão, amarela e magrela!

Quando ainda menino tive muitas brigas. Numas saí como vencedor, noutras fui a nocaute. Hoje, vou garimpando o fruto do ouro que cada uma delas em mim semeou, selou e chancelou. Encontrava-me na prisão de mártir.
Veio a adolescência e junto às lutas ribeirinhas. Foram muitas e homéricas. Faraônicas… O tico e o teco viviam em ebulição. Iam aos tapas à exaustão. Debatia-me em convulsão. Rolava sobre mim mesmo sem jamais saí do chão. Eram noites de bravatas no leito de um solitário colchão. Eram dias bizarros. Piloto automático. Era uma luta em lampejo entre o fogo e o aço. Por vezes, era o máximo; noutras, frangalhos. Ia me retorcendo sobre um corpo viril e fracasso.

Já rapaz vieram as batalhas em fúria. Agora eram dois corações a serem misturados e domados. Conflito ferrenho. A jurisdição era meio a meio. Agora, havia uma balança com seu fiel rude e imparcial. As armas a serem escolhidas estavam ao sabor de cada um: amar ou sofrer. O menu era simplicidade e confusão. Amalgamar dois corações não é ofício fácil, não. Vão-se amando e vão brigando a um só tempo. São tempos bélicos. Mar em fúria. Tempestade em copo d’água. O tempero é eclético em dicotomia: entre tapas e beijos. O coração neste ínterim dá de pular e pulsar.

A boca dá de beijar e brigar. Vai-se vivendo pela metade. Fatiado no peito do outro. E vai se levando outra metade, que está entre os braços e abraços, mas jamais a detém. A mão menina, que enrosca na minha, é minha face feminina. Ainda, que seja uma outra carne, numa outra face, é uma parte da outra metade que não dá para se separar. É uma água que só tem sabor se dois lábios tocar. A ansiedade é a companheira de quem ama. É um corpo evaporando para regar e regra o outro. O front de quem ama jamais depõe as armas.

Amar é bom demais!

Nas guerras, passei a ser macaco-velho e despojado. Depois das batalhas e das abelhas, forjou-se um novo líder. Agora é tempo de paciência para se vencer ao vencedor. As intempéries são o pato e o prato do dia. As calmarias nos fazem bobos. Que venham os embates. As turbulências conduzem o arco e o barco. O fracasso já não importa, porque mesmo perdendo ainda se ganhar. E, assim, como as brigas, as lutas, e as batalhas, as guerras foram tantas. Algumas venci, outras lutei e noutras perdi. Porém, uma me fez morrer de sede em frente ao mar: o amor, jamais o venci!. Navegava nas ondas do céu com os urubus. Vivia sapecado de sol.

Dormia sonhando com a rua, virgem e nua, onde posava a lua: ah, se esta rua-lua fosse minha, eu mandava ladrilhar. Meu coração é partilha e emoção. O saltimbanco trapalhão é nascedouro dos meus risos. O circo jamais deixará de ser criança. É por isso que ele veste pijama. Circo é o arco-íris do palhaço. O crepúsculo começa a arranhar as telhas domésticas e já mergulha no horizonte.

Queria comer um peba na pimenta!

A mochila passa conduzindo o estudante em boné da Nike. O menino passa com a janela do táxi como moldura da face viva. Mas não era o cubo de Picasso. O tênis e a academia passam conduzindo o corpo. Os automóveis coloridos passam de olhos arregalados: bateu o sino anunciando a Ave-Maria. A moça arrasta as mesas e as cadeiras coloridas para ornamentar o jardim do bar. O rapaz do jogo do bicho recolhe a mesa, as cadeiras e põe a máquina debaixo do braço, pede uma dose de birita e desce rumo à casa da mãe. Seu Mundoca está com o joelho baleado, bichado. Faz parte do ácido úrico e da idade. A garota passa puxando o sutiã para que o mesmo abarque todo o seio suado e cansado.

Saiu me espreitando rente a parede e fujo. Um senhor passa de óculos à mão esfregando a vista e a lida. “Olha o gás!” Grita o rapaz sobre uma moto velha com ombro e vista cansados. O semblante é seco e árido… pele em papelão. Vem o braço da menina carregando o destino da mãe. Os cadernos e os livros pedem carícias da normalista. O moço passa afiando o cigarro. Num bolso a carteira, no outro o isqueiro. Os marimbondos em lata começam a invadir as colmeias do condomínio. A dono Janete, sentada à calçada, balança as pernas finas e idosas. O tempo não perdoa.

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