O encontro foi pensado em quatro modalidades de cirandas: as Cirandas Temáticas, que trazem proposições de temas contemporâneos e que foram pesquisados por acadêmicas/os e de outros saberes com metodologias sensíveis, a exemplo da abordagem Sociopoética e afins; a Usina das Oficinas, que serão os momentos das vivências das metodologias sensíveis desde as discussões das Diversidades/Diferenças; a Usina das Comunicações das metodologias sensíveis com/entre diversidades/diferenças, onde ocorrerá a comunicação oral de trabalhos das Escritas-sons-imagens-performances em conformidade com os temas indicados neste projeto; e as Cirandinhas Brincantes, que destina-se a presença das crianças no evento com o desejo de acalentar, acolher e brincar com/entre crianças nos espaços do CCE.
A professora Shara Jane Costa Adad, coordenadora do evento, fala sobre os objetivos do Encontro. “Produzir potências do corpo, de modo a operar a invenção de si e de mundos é a proposta desse evento, dando visibilidade as nossas produções, de modo experiencial, de modo que a gente sinta na pele essa experiência de viver ‘sociopoeticamente’ o mundo, a partir da invenção, dessa transformação política que acontece no meio das coisas, no meio do mundo”, coloca.
A iniciativa de pensar metodologias sensíveis que potencializem dimensões do corpo com o uso de dispositivos artísticos realça a inter/transculturalidade, a transversalidade e a interseccionalidade nas pesquisas decoloniais sociopoéticas e abordagens afins. Isto possibilitará a criação e a articulação de circuitos de diálogos entre diferentes profissionais da Educação, Psicologia Social, Saúde e Arte sobre a produção coletiva e social do conhecimento na formação destes sujeitos tendo em vista a inclusão e a participação das diversidades/diferenças no pesquisar, no cuidar e do aprender.
A divulgação de produções metodológicas qualitativas e sensíveis toma um novo fôlego no espaço universitário da UFPI, ao trazer para o nível local as diferentes produções (artigos, relatos de experiências, vídeos, mostra fotográfica, performances etc.) em nível nacional e internacional ao agregar diferentes sujeitos e experiências acadêmicas e de outros saberes entre profissionais interessados nas sensibilidades de saberes, na invenção de si e de mundos na pesquisa, no ensino e na extensão.
A metodologia do evento pensada a partir da metáfora da ciranda sublinha-se pelo entendimento de se pensar conhecimentos acadêmicos e não acadêmicos como algo que é de todos nós. Ou seja, a ciranda é uma dança comunitária que não tem preconceito quanto ao sexo, cor, idade, condição social ou econômica dos participantes, assim como não há limite para o número de pessoas que dela podem participar. Começa com uma roda pequena que vai aumentando à medida que as pessoas chegam para dançar, abrindo o círculo e segurando nas mãos dos que já estão dançando. Tanto na hora de entrar como na hora de sair, a pessoa pode fazê-lo sem o menor problema. Quando a roda atinge um tamanho que dificulta a movimentação, forma-se outra menor no interior da roda maior.
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História da Sociopoética
A Sociopoética foi criada no Brasil pelo poeta, filósofo e pesquisador em educação popular e intercultural Jacques Gauthier, na continuação das suas lutas contra o colonialismo e em eco à sua formação em Análise Institucional e Teatro do Oprimido – práticas libertárias e poéticas libertadoras.
Na terra do educador Paulo Freire, com o decorrer dos anos e em interação com as poéticas espirituais brasileiras de matrizes indígena e africana se ampliou a área de interação entre saber e sabedoria, entre ciência e espiritualidade na produção do conhecimento.
Apesar de ser principalmente um método de pesquisa, no sentido dado a essa palavra por Edgar Morin na sua Teoria do Pensamento Complexo – com desdobramentos em práticas de Educação e Enfermagem – logo, de não ter apego à qualquer corrente teórica que seja, observamos que a Sociopoética se dá particularmente bem com referenciais revolucionários tais como a esquizo-análise de Deleuze e Guattari, a teoria dos micro-poderes segundo Foucault, a teoria da ecologia profunda e certas abordagens de inspiração budista, ou ainda, com a teoria feminista do “Care”.
A sociopoética segue cinco orientações básicas, suas cinco estrelas multicolor, conforme explicita Gauthier In. O Oco do Vento, Curitiba: Ed. CRV, 2012:
- A instituição do grupo-pesquisador, coletivo sensível e inteligente autor e responsável pela pesquisa, inspirado nos “Círculos de Cultura” segundo Paulo Freire: os participantes, chamados de copesquisadores, são pesquisadores e pesquisadoras de si, através da potência do grupo acolhedor das angústias, desejos e prazeres de cada um/a, sem julgamento nem preconceito.
- Um extreme cuidado com as culturas dominadas e/ou de resistência é a segunda estrela da Sociopoética. Qual sua cor? Você decide! Culturas indígenas, afrodescendentes, culturas de mulheres, de trabalhadores do campo e da cidade, culturas de crianças, culturas de moradores de rua etc. Essas culturas, nas quais as potências do corpo desempenham um papel decisivo, devem interferir na interpretação e até na produção dos dados de pesquisa.
- Assim, a terceira orientação da Sociopoética é a exigência de se produzir conhecimentos a partir de todas as potências do corpo, e não apenas da razão abstrata: a sensibilidade, a emoção, a intuição, a gestualidade, a imaginação, e até a razão prática da palavra certa no momento certo.
- Daí o caminho das artes, da prática de técnicas de inspiração artística para a produção dos dados: artes plásticas, música, dança, teatro, contos e poesia são o caminho real para que se expressem esses saberes do corpo, geralmente velados, subconscientes ou inconscientes. Com dinâmicas de inspiração artística queremos que participe da pesquisa o inconsciente de cada um/a – pelo menos, aquilo que nunca seria expresso em entrevistas, por causa do autocontrole racional da fala do entrevistado por si próprio. Cada técnica de pesquisa produz certo tipo de dados, e não outro.
- A quinta orientação é o cuidado com a posse da pesquisa, pelo próprio grupo-pesquisador e o coletivo acolhedor da mesma, e não pela academia. Esse aspecto é politica e cognitivamente da maior importância: a Sociopoética fornece dispositivos para que aqueles detentores de saberes populares se tornem filósofos, ou melhor, vivenciem um devir-filósofo através do grupo-pesquisador. Eles participam da produção de saberes científicos sem que esses saberes lhes sejam roubados pela academia.