100% PIAUÍ

“Cronicando o Piauí” com Antônio Neto Sampaio – A perda é uma falta mal temperada

Antônio Neto Sampaio

A perda é uma falta mal temperada: sem corante, sem azeite, sem cheiro-verde, salgada, sem alho, sem cordialidade, sem meiguice, ácida, sem afeto, sem carícia, sem afago, amarga.

O perder é rústico, covarde, grosseiro, injusto.

É o corte cego de uma navalha velha.

Não temos como mensurá-la.

Quando dizemos que perdemos, dizemos nos faltar alguma parte, que nos levaram um bom pedaço, que nos deixaram sem norte, que nos roubaram a sorte, que nos entregaram à morte.

Na perda não há arte!

Há sempre uma voz rouca e clandestina, que não sabemos de onde surge, em qual esquina se esconde, por qual labirinto se equilibra.

Dizendo-nos que não houve uma perda, mas, de certa forma, um salto.

Esse tubo de linha zero passado no cerol (goma, cola e pó de vidro) tem seu percurso, percalço, ladeira íngreme, curva perigosa, ponte estreita.

Há momentos em que andamos em reta linha. Noutros, seguimos em espiral. Noutros somos paragem: parada para embarque e desembarque.

Ainda há os que recebem e dão pêsames, parabéns, esmolas… Embora sabendo que somos cidadãos do Céu, passamos uma vida carregando nas costas as nossas dores.

Como somos peregrinos desta nave estrelada, a girar sob o Céu, jamais haverá ganho.

Pois ao nascer, já perdemos.

Antônio Neto Sampaio
Sair da versão mobile