É uma senhorinha miúda, mas de força graúda. Vestidinho de chita, cabelinho grisalho, mãozinha tímida, em passos curtos e coxos. Vai vendendo beiju, com ou sem coco, com ou sem leite moça. Leva o material de venda numa rudia sobre a cabeça, e à mão os lencinhos. Ela é manca de uma das pernas. Um pé caminha em repouso; o outro em atalaia. Cravo ao meio da chinela. Diz que a vida hoje é muito boa, pois duro era na roça. Sol brabo!
“Sou queimada assim, seu moço, é de labutar na roça, com animá. O qui agente gãia, só dar pra comer, e mal. Num compra nem uma peça de roupa, porque num dar. É pobreeeza! Fooome! Sofrimeeento! Sê num passa daquilo ali. Se vai na budega, é uma xíca de açúcar, mei quilo de farîa, mea garrafa de querosene. É uma lástima! Eu é qui num vou morrer aqui!, capei o gato”.
Os dedos das mãos são em desalinho. Machucados pelo cabo da enxada, pelo cabo da foice, pelo cabo do machado e pela dor do sofrimento da lida. Mas ela não se acovarde, e não sabe o que é depressão. Sua marca maior é o riso, e a satisfação em viver. Seu carro chefe, é a felicidade, em poder ao final do dia, comprar pão e leite, pra levar pra casa. Diz que a vida é doce. Que é bom viver. Pergunto-lhe se já teve vontade de morrer. “Deus que me livre! Viver é bom demais, meu fio!”
– Quantos bejus, vosmecê, leva?
– Cinquenta de maiã e cinquenta à tarde.
– Vende tudo?
– Vendo! Tem dia que demoro a vender. Mas só volto quando seca tudo.
– E seus filhos?
– Só mora comigo, uma fia e uma neta. (e vai logo emendando) É mãe solteira!!! O cabra não quis prestar, mandei ambora, seu Neto.
– É assim mesmo!
– É. Hoje, em dia, os casamento num acaba nem um pacote de sal, junto!
– Verdade!
– Eu lhe digo a verdade: eu num quero mais diabo de home, nããão, seu Neto.
– É mesma?
– Eu lá quero essas peste ruim!!! (rs)
Ainda, com a barriga soluçando de tanto sorri, indago-lhe:
– Quanto devo??? (rs)
– Foi seis? Nove real.
– Amanhã, nos veremos.
– Se Deus quiser!!!
Lembro do semblante dela, dano-me a ri. “Ótima higiene e terapia mental. Já ganhei o dia”.